Governo do PT Compra Comida Para Governador Agnelo Queiroz. Morador de Rua Envia-lhe Carta.
Josias de Souza (23/02/2014)
O governo do Distrito Federal gastará cerca de R$ 1,5 milhão em 2014 para encher a geladeira e a despensa de ‘Águas Claras’, a residência oficial do governador Agnelo Queiroz (PT). A lista de compras, disponível aqui, contém 464 itens. Só em peixes e carnes serão 21 toneladas. Coisa de R$ 500 mil.
Comparando-se com o custo do ano
passado, o preço da comida da casa do governador subiu 20%. Ouvido pela
repórter Roseann Kennedy, o GDF atribuiu a alta a
dois fatores: a inflação e a Copa. Não a copa que fica ao lado da cozinha, mas
a Copa do Mundo. Brasília é uma das cidades que receberão jogos da Copa.
Alega-se que Agnelo recepcionará delegações estrangeiras em casa. E precisa dar
de comer aos convidados.
Nos próximos dias, um estômago pobre
de Brasília, desses que vivem na rua, enviará uma carta a Agnelo Queiroz. O
blog teve acesso ao texto com exclusividade. Vai reproduzido abaixo:
“Caro governador, sei que o senhor não me conhece. Pois permita que me
apresente. Moro onde olho nenhum me alcança, no ermo das entranhas. Sou ferida
exposta que não se vê. Sou espaço baldio entre o esôfago e o duodeno.
Trago das origens uma certa vocação para a tragédia. Não deve ser por outra
razão que venho do grego: stómachos. Se pudesse dar entrevista,
resumiria assim o oco de minha existência: ‘É dura a vida de víscera.’
Às vezes, governador, invejo o
coração que, quando sofre, é de amor. Eu, pobre tripa flagelada, jamais tive
tempo para sentimentos abstratos. Perdoe-me o pragmatismo estomacal. Mas só
tenho apreço pelo concreto: o feijão, o arroz, a carne… Meu projeto de vida
sempre foi arranjar comida.
Às vezes, veja o senhor, cobiço a
cabeça. Quisera me fosse dado revisitar glórias passadas ou, melhor ainda,
idealizar um futuro promissor. Quisera não tivesse que dançar ao ritmo da
emergência.
Meu mundo cabe no intervalo entre uma refeição e outra. Meu relógio,
caprichoso, só tem tempo para certas horas: a hora do café, a hora do almoço, a
hora do jantar…
Sem comida, meu relógio ficou louco.
Passou a anunciar a chegada de cada novo segundo aos gritos.
Nunca
tive grandes ambições. Não quero conhecer a Paola Oliveira. Não quero ganhar a
Sena acumulada. Só queria a compaixão de um grão escorregando faringe abaixo.
Ardem-me
as paredes, bombardeadas por jatos de suco gástrico. Mas já não sofro,
governador.
Sem alimento, encontrei a paz na
melancolia da fome. Encontro-me na ante-sala de outra esfera. Escrevo para
dizer-lhe obrigado. Estou prestes a trocar o inferno das ruas pelo paraíso. E,
temente a Deus, sei que Ele não se atreverá a pôr em meu céu o descaso. Não,
não. Meu céu há de ser uma cozinha como a da residência de Águas Claras, tão
farta que me propicie uma fome de governador, dessas que a gente resolve
simplesmente abrindo a geladeira.”
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